Quando imaginamos heroínas e princesas, usualmente atribuímos às primeiras valentia, força, coragem, enquanto que às segundas creditamos nobreza, delicadeza, amabilidade. As heroínas e as princesas costumam estar sempre longe em nossos pensamentos, retidas num passado infantil ou apartadas, inseridas em situações extremas. Elas também jamais são ambas as coisas, como se impossível fosse a reunião de tão incríveis atributos. Eu, no entanto, tenho uma heroína que é também uma princesa e ela está bem perto de mim, logo ali, na sala, lendo Júlio Verne. Digo que tenho, mas não é minha, como se coisa fosse. Ela é uma pessoa, uma pessoa que é um dom, um presente, um empréstimo divino. Além disso, é importante dizer que ela não sabe que é uma heroína princesa (e é importante que nem venha a saber, pois a vaidade sempre espreita). Inocentemente, imagina ela ser apenas minha filha. Não suspeita que salvou-me a vida muitas vezes e de muitas maneiras diferentes.

Nove anos atrás, no dia 10 de fevereiro, minha heroína princesa nasceu, e veio sob a forma do bebê mais fácil e dócil do mundo. Nada de cólicas. Nada de manhas. Nada de noites em claro. Nada disso. Apenas um serzinho de cabelos pretos (que depois clarearam um pouco) e bochechas quentinhas, sorridente, tranquilo e fácil de satisfazer. Salvou-me, então, do medo de pensar que, nela, enfrentaria um desafio invencível. Trouxe-me confiança e tranquilidade.

Aos poucos, bem aos poucos, conforme minha heroína princesa crescia, discretamente (como convém a uma princesa) exigia mais de mim. Mas de um jeito tão suave, tão alegre, tão tranquilo que não me era tão difícil assim doar-me, ainda que aos poucos, bem aos poucos, com alguma relutância típica de quem tem o coração pequeno e duro. Salvou-me, então, do egocentrismo, fazendo-me ver e ir para além de mim. Trouxe-me abnegação e generosidade.

Já maiorzinha, naquela idade em que a comunicação por palavras se torna mais consistente, minha heroína princesa demonstrava-me tanto amor, tanta admiração (da qual sou indigna, aliás), tão espontânea e livremente que libertou-me dos meus limites. Salvou-me, então, da necessidade de reciprocidade, da entrega falsa, do sentimento calculado, da prisão da insegurança. Entregou-me seu coração transbordante e fez meu coração jorrar.
Agora, mocinha, minha
heroína princesa continua me salvando. Não mais sozinha, mas com a ajuda
de dois outros príncipes, os quais, junto ao rei que é seu pai,
livraram-me diária e repetidamente de meu pior pesadelo: eu mesma. Hoje,
graças a eles (e a Deus), não preciso mais tentar salvar-me, mas posso
entregar alegremente, pois é aí, nessa entrega, que descubro como ser
feliz de fato, sem medo, sem egoísmo e sem limites.

Minha filha, minha heroína, minha princesa, que Nosso Senhor te conceda um aniversário verdadeiramente feliz.


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  1. Uau!!! Parece a minha que tenho aqui em casa, vc colocou em palavras aquilo que eu apenas sentia, e nao sabia me expressar… Ser mãe é se salvar?! Não é mesmo??

  2. É, provavelmente, eu ainda acabe descobrindo que a melhor coisa que pode acontecer a uma mulher depois de encontrar a Cristo é ter filhos. Parece-me que neles é que o amor começa de fato a lançar fora o medo. Amei esse texto. Encorajador!

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