Também em se tratando de educação, especialmente de educação infantil (pré-escola e séries iniciais), a “febre” da novidade se faz onipresente. Não basta que apenas as roupas, os cabelos, os telefones, os eletrodomésticos, os carros, as músicas e até os relacionamentos exalem novidade, ressoem o “último grito”, sejam a mais perfeita expressão das tendências. Importa também que a educação se proponha a inovar, a ser criativa, espontânea, dizem. Ser dinâmico, interativo e lúdico também são partes do “molho base” do cardápio.

É claro que em si mesmas tais coisas não são ruins, não prejudicam necessariamente o aprendizado. A questão é que todas elas referem-se à forma, não ao conteúdo daquilo que é ensinado. E quando a forma, a aparência, o método torna-se mais importante que aquilo mesmo que é objeto de estudo, então cai-se numa espécie de futilidade educacional, onde pouco importam as coisas mesmas, mas predominam a apoteose, as cores, as luzes, os sons, enfim, o show.

Repito, não há nada de errado em propor uma tarefa de maneira divertida, valendo-se das novas tecnologias, por exemplo. O problema é quando a diversão ou quaisquer outros elementos acessórios tornam-se o centro, os protagonistas da questão, relegando ao conteúdo uma posição de coadjuvante, ou, o que é pior, às vezes apenas uma ponta como figurante. Não raras vezes uma tal inversão serve apenas para encobrir a preguiça ou incompetência daquele que ensina, iludindo e esgotando o tempo de seus alunos.

Qualquer um que já tenha refletido minimamente sobre o modo como aprendemos, perceberá que não se trata de um processo fatiado, estanque, mas contínuo, cumulativo, constante. As analogias que eu poderia citar para ilustrar tal fato são muitas: uma construção que precisa de alicerces, fundamentos e de muitas outras coisas antes de pretender atingir o segundo andar; uma receita que precisa dos ingredientes para elaborar um prato; a árvore que precisa ser semente antes de dar frutos, etc. Só assim é que se avança nos conteúdos, nas matérias, nos assuntos: aos poucos, conectando as partes, consolidando o que veio antes para poder assimilar o que virá depois. Não pode haver avanço sem que haja consolidação, onde aquilo que foi aprendido torne-se patrimônio indissociável da pessoa que o possui, caso contrário, o resultado será o que mais vemos por aí: crianças que precisam resolver uma fórmula de Bhaskara mas que não sabem raíz quadrada.

Mas para que haja consolidação é preciso que ocorra a repetição, a tão temida estraga-prazeres desses nossos dias fashions. Sim, refiro-me à velha e boa revisão, ao antigo e antiquado “mais uma vez”. Afinal, quando é que executamos uma atividade à perfeição (ou quase) se não quando a repetimos tantas vezes ao ponto de dominá-la inteiramente, de torná-la parte de nós? Vejo isso dia após dia com a Chloe, quando além de abrir-lhe novas “janelas”, a conduzo pelos já conhecidos cômodos e corredores dos conteúdos conhecidos, para que veja e não esqueça como são as coisas de sempre, podendo, assim, acrescentar novidades ao seu universo sem perder nada daquilo que nele já havia. A repetição é serva fiel da memória, guardiã do passado e ama do futuro.

Assim, deixo aos meus leitores o estímulo (que é também um desafio): sejam divertidos, modernos, lúdicos sempre que isso for possível e conveniente na hora de transmitir o conhecimento, mas nunca, nunca deixem de consolidar, por meio da repetição, aquilo que já foi ensinado. Não sejam reféns, cedendo aos apelos das modas, em prejuízo dos conteúdos. Mozart nunca teria sido Mozart se precisasse relembrar onde ficava a tecla “la” no piano; Da Vinci jamais teria sido Da Vinci se precisasse redescobrir a cada pincelada o resultado da mistura dos pigmentos; Churchill jamais teria sido Churchill se precisasse reaprender a localizar a Alemanha no mapa a cada batalha.

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