Alguém aí consegue imaginar Salomão dizendo a Deus: “Certo, Senhor, aceito todas as coisas que queres dar-me por ter pedido apenas sabedoria para cuidar do teu povo, mas, por favor, não me dê riquezas demais, mas apenas o suficiente”? Alguém aí consegue imaginar-se no lugar de Salomão dizendo semelhante loucura? Não, né? Afinal, prosperidade nunca é demais, riqueza nunca é demais, recurso nunca é demais. Quantas pessoas poderíamos ajudar se tivéssemos todo o dinheiro que gostaríamos, não é mesmo?! Quantos missionários poderíamos abençoar, quantas famílias poderíamos amparar, quantos, quantos!
No entanto, curiosamente, o próprio filho de Deus estabelece as coisas de uma maneira bem pouco usual para nós. No Evangelho de São Mateus, no capítulo 16, após contar aos discípulos que seria necessário padecer muitas coisas, morrer e ressuscitar para cumprir o desígnio redentor de Deus, Jesus é incitado por Pedro a deixar de desvario, a ter compaixão de si, a cuidar de si, a poupar-se, afinal, onde já se viu, alguém como Jesus, deixar-se moer, destruir, e isso ainda ter a ver a vontade de Deus. Isso já era demais!
Mas, em seguida, Jesus, corrigindo a Pedro, estabelece a atitude correta àqueles que desejam ser seus discípulos.
“Se alguém quiser vir após mim, renuncie-se a si mesmo, tome sobre si a sua cruz, e siga-me; porque aquele que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á, e quem quiser perder sua vida por amor de mim, acha-la-á. Pois que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se perder a sua alma? Ou que dará o homem em recompensa da sua alma? Porque o Filho do Homem virá na glória de seu Pai, com os seus anjos; e então dará a cada um segundo as suas obras.”
Em outras palavras, a coisa mais preciosa que há é a alma humana. Nada vale mais do que isso, nem as riquezas de Salomão, nem mesmo o mundo inteiro. E o único modo de salvá-la, isto é, de garantir-lhe a vida eterna em lugar da condenação eterna é perdendo-a por amor de Cristo. E como se pode “perder a vida por amor de Cristo”? Vivendo uma vida de sacrifício, isto é, renunciando-se (abrindo mão de si, dos seus mimos, das suas vontades, das suas vaidades, das suas seguranças, dos seus planos, dos seus estribos), tomando sua cruz (sua circunstância, sua realidade, seus problemas, suas dificuldades, seus relacionamentos) e seguindo a Cristo, procurando pisar nas suas pegadas, escolhendo os caminhos que Ele escolheria, de passagens sempre estreitas e pedregosas, rumo ao fim, rumo à morte (rumo ao início, rumo à vida).
Mas e o que isso tem a ver com o início deste texto, quando falei sobre o fechamento das mulheres cristãs à vida, sobre a incompreensão por parte delas daquilo que eu havia escrito? Tem a ver que elas é que têm decidido o quanto é razoável renunciar-se, o quanto convém negar-se, o quanto é possível abrir mão de si sem comprometer-se muito, mantendo aquela margem “racional” de “amor próprio”, de “segurança”, de “estabilidade”, seguindo bem ao estilo da sugestão que Pedro havia feito ao Senhor, e isso especialmente no que diz respeito à maior riqueza de Deus: a vida de novos filhos Seus. Até quando, mulheres? Até quando seguiremos ao Senhor somente enquanto parecer-nos razoavelmente fácil? Até quando seremos fiéis a Ele somente enquanto não formos vigorosamente postas à prova? Até quando prosseguiremos agindo voluntariamente como crianças na fé, como imaturas, como quem tem todas as razões do mundo para desconfiar de Deus? Até quando usaremos a igreja para desobedecê-la, escondendo-nos atrás de uma suposta “paternidade responsável”!? Até quando daremos esse testemunho ridículo e covarde?! A sua vida é Dele ou não é, afinal?! Você vai ou não vai morrer por amor Dele?!
Escolham. E escolham logo. Parem de perder tempo em cima do muro. Ou tudo é para Ele ou nada é para Ele.
E antes que me venham criticar dizendo que é muito fácil falar assim, afinal de contas eu gozo de uma série de confortos, seguranças e comodidades, faço questão de deixar claro o seguinte: eu não tenho casa própria, não tenho plano de saúde, não tenho dupla cidadania, não tenho passaporte e não tenho renda fixa mensal. Mas tenho, além do amor redentor do meu Senhor, um marido que cuida de mim, me ama e me santifica, uma filha de 9 anos, dois filhos, um de 4 anos e um de 2 anos, e, agora, mais um bebezinho em meu ventre, que ainda não sei se é a Agnes ou o Teófilo, e que devo poder abraçar dentro de pouco mais de 8 meses.
Eu escolhi morrer para viver, escolhi entregar para ter, escolhi perder aqui para ajuntar no céu. Não é fácil. Mas a fé cristã nunca é fácil.